quarta-feira, 8 de junho de 2011

Hipocrisia


Hoje falo de hipocrisia. Comecemos pela etimologia: provém do grego ὑποκρισία (HYPOKHRINESTHAI), e significa “representar um papel, fingir”, formado por HYPÓS (“abaixo”) e KRINEIN (“separar, escolher, peneirar”). A evolução do sentido foi de “separar gradualmente” para “responder”, como em “responder dentro de uma peça de teatro” ou, em última análise, “representar, fingir um papel”.
  Esta semana, como é habitual logo após ser declarado o vencedor das eleições legislativas, deu-se a "chuva oblíqua" do costume: várias mensagens de congratulação ao nosso futuro primeiro-ministro, mais e menos cínicas, mais e menos sinceras, da esquerda à direita, passando pelo estrangeiro. Ora, de todas as que tive oportunidade de captar, destaco certamente a que mais me fez sorrir... em tom amarelado: estou a falar das declarações de um dos maiores empresários (política e grandes empresários, como tão bem sabemos, têm-nos dado os resultados que temos visto ultimamente) portugueses, de seu nome... Belmiro de Azevedo.
  Grosso modo, o que o Homo-Sonae afirmou foi "nunca vi um político fazer tanta coisa errada em tão pouco tempo" (em alusão a José Sócrates), "o PSD tem todos os meios para governar" e "os políticos são inábeis e ditadores". Vindo de uma sumidade em ciências políticas, realmente é de me levar a pensar que... ah, mas espera: o Engº Belmiro de Azevedo NÃO É uma sumidade em ciências políticas, logo... terá tirado um mestrado de 15 dias, tipo Novas Oportunidades? Terá ido a Fátima e recebido uma luz divina, uma epifânia? Ou (e vou por este caminho) está agora a mostrar a Portugal que é o cobarde moral evolutivo padrão neste panorama desolado que é Portugal? Que lhe interessa falar de um assunto que pura e simplesmente não faz parte das suas competências quando, como bem sabemos, é possuidor de uma fortuna um tudo nada grotesca? Que perderia ele com isso, bem vistas as coisas? Depois, gosto de juntar alhos e bogalhos para ver se consigo fazer éclaires de chocolate: que sentido moral é este de dizer que Portugal não tem bons políticos quando, se ele se olhasse ao espelho, perceberia que nem bons políticos nem bons empresários? O sr. Engº Belmiro de Azevedo diz que o país precisa de uma mudança, de um governo sólido e de políticos que tenham sentido de Estado e que, acima de tudo, velem pelos interesses de Portugal. É nesta altura que eu misturo os bogalhos aos alhos: qualquer miúdo de 15 anos sabe que uma das formas que pode ajudar Portugal a sair desta grave depressão é (rufem os tambores, por favor)... CONSUMIR PRODUTOS PORTUGUESES. Consumir produtos portugueses faz crescer a economia de um país, pois CRIA-SE, PRODUZ-SE e, consequentemente, VENDE-SE, tanto cá como lá para fora. Tomemos dois exemplos simples: a empresa Ach. Brito é uma coqueluche em termos de produtos de higiene de alta gama no resto do Mundo, tendo clientes fiéis como o consagrado actor Nicholas Cage. Num ramo completamente distinto, temos a empresa Lacticínios das Marinhas, que é conhecida nos hotéis de 5 e 7 estrelas por esse mundo fora (e por cá também, em alguns hotéis muito requintados) por fabricarem uma das (senão mesmo a melhor) manteiga artesanal do mundo, bem como queijos ímpares. Estamos a falar de duas micro-empresas que possuem nichos de mercado, mas que, não obstante, PRODUZEM CÁ. E o importante é mesmo isso. Voltando ao sr. Engº e mui benemérito empregador dos 500 euros por mês: a Sonae importa todo o leite de marca branca (vulgo "Marca Continente") à França e à Alemanha, por... ser mais viável em termos económicos. A pergunta para 250.000 euros é: mais viável para quem? Certamente para a carteira dos portugueses, certamente para a Sonae... mas muito com certeza prejudicial à economia do país por termos que importar um bem essencial, e é de referir que Portugal é auto-suficiente na produção de Leite, mas importa leite ao estrangeiro, nomeadamente de Espanha, Alemanha, França e Polónia. Muito dos nosso agricultores não conseguem vender o Leite que produzem. Assim, e porque os produtores e distribuidores só pensam em "venha a nós", pois têm que "defender os seus interesses" (então a Sonae, no que toca a defender interesses, ui ui meus amigos...), relegam os interesses dos portugueses e de Portugal para segundo plano, fazendo com que a importação seja obrigatória, tornando-se assim em catalisadores da tal crise. Qualquer embalagem de leite tem, por decreto nacional (Decreto-Lei nº560/99 de 18 de Dezembro de 99, Alterado pelo DL nº 365/2007 ) o local da sua proveniência impresso na embalagem, tal como a imagem de baixo sugere:


 


Caso o produto não tenha uma destas denominações, será obrigatoriamente estrangeiro, ou importado. Se fica mais caro que o importado? Em alguns casos fica mais barato: o Grupo Auchan (Jumbo e Pão de Açúcar) vende leite português a 0,39 centimos/embalagem. Se tem o sabor do leite de marca branca do Continente? Não sei. Sei, sim, que o sabor amargo a crise continuará. Em parte, devido a alguns Engenheiros que não têm nada a perder. 

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